Cada
sociedade tem suas categorias e profissões. Mesmo na sociedade mais
igualitária, como a da Rússia, que teoricamente deveria ser a mais
igualitária por ser comunista, notamos especializações. Lá encontramos
comerciantes, gerentes industriais, trabalhadores intelectuais e manuais.
Também encontramos falsos sacerdotes da Igreja Cismática russa, que é
totalmente controlada pelo governo comunista.
Para
haver especializações é necessário que haja homens em posições diferentes,
tanto superiores quanto inferiores. Assim, em cada nível encontramos homens
com diferentes funções a desempenhar. Fingir que todas as profissões sejam
iguais procura estabelecer uma vantagem que favorece as profissões de menor
importância. Na verdade, é o que deveria acontecer nas ditaduras do
proletariado, na qual apenas os proletários ou os trabalhadores manuais
teriam o direito de governar, e não aqueles que exercem funções superiores.
Agora, se isso é verdade nas sociedades igualitárias, aplica-se mais ainda
nas sociedades como a nossa, que não são completamente igualitárias e ainda
apresentam alguma hierarquia. Aqui temos, de fato, diferentes classes
sociais, como a burguesia, classe acima dos trabalhadores manuais; depois a
classe militar, a classe jurídica, a classe intelectual e o clero.
Questões que decorrem daí:
-
Qual
desses diferentes grupos, teoricamente falando, tem o maior direito de ser
preponderante na organização da sociedade?
-
Na
Idade Média, como se fazia a distribuição de funções na sociedade?
Como o paganismo resolveu a questão da diferença de classes
Na
Índia, o sistema de castas prevaleceu. Segundo esse sistema, a pessoa
pertencia a uma determinada casta apenas pelo fato de nela ter nascido. Não
havia possibilidade de mudar de uma casta para outra.
Um grupo de intocáveis condenado a uma vida de exclusão no sistema de castas Indiano |
Os
indianos entendiam as castas de maneira religiosa. Eles acreditavam que após
a morte a alma encarnaria em outros corpos. Se uma pessoa tivesse praticado
a virtude, sua alma encarnaria em um elenco superior; se tivesse sido ruim,
encarnaria em uma classe inferior. Assim, a classe social de uma pessoa já
estava determinada antes de seu nascimento.
Agora, se a classe social é determinada por uma vida anterior, então não é
possível nesta vida para ninguém mudar seu lugar na sociedade. Assim, na
Índia, a pessoa estava completamente trancada na classe social a qual
pertencia, sem possibilidade de subir ou descer. As classes sociais eram
hereditárias e fixadas de forma permanente.
Um
sistema semelhante também prevaleceu no antigo Egito. Foi organizado de tal
forma que um terço das terras pertencia à classe sacerdotal, um terço à
classe militar e o outro terço ao faraó.
As
classes sacerdotal e militar foram absolutamente fixas. Um padre nunca
poderia ser militar; ele deveria ser sempre padre. Seus filhos também foram
sacerdotes para sempre. Isso vale igualmente para um militar. Todo filho de
militar deveria seguir a profissão de seu pai e ninguém de outra classe
poderia ingressar nela. Essas eram as duas classes bloqueadas; sob eles
estava a massa da população, que constituía o plebeu do Egito.
Como a Igreja Católica resolveu a questão
Na
civilização medieval, a Igreja Católica reconheceu três classes básicas: o
clero, a nobreza e o povo. Enquanto mantinha as diferenças, ela mudou de
modo radical alguns aspectos delas.
A
primeira classe da sociedade era o clero. Foi uma classe totalmente aberta a
todas as pessoas que tivessem vocação para ingressar nela. A Igreja nunca
exigiu que uma pessoa pertencesse a uma determinada classe social para se
tornar membro do clero. Pelo contrário, tornou-se frequente ver pessoas das
camadas mais modestas da sociedade ascendendo aos mais altos cargos na
hierarquia eclesiástica.
Atos heroicos fizeram os soldados ascenderem à nobreza |
A
segunda classe era a nobreza. A nobreza era uma classe hereditária, mas aqui
também havia diferenças notáveis em comparação com os sistemas pagãos. Uma
das diferenças mais importantes era que um nobre poderia perder o seu
status de classe se praticasse um ato infame. Também era notável que um
plebeu poderia ascender à nobreza se realizasse um ato público significativo.
Assim, a classe nobre não era uma situação trancada, na qual fosse
impossível alguém entrar ou sair. Havia certa flexibilidade permitindo uma
lenta renovação. Aos poucos, os deficientes ou depravados iam sendo
eliminados e pessoas com sangue novo iam entrando por causa de suas virtudes
e habilidades. Era uma classe na qual havia grande estabilidade, mas era uma
classe aberta.
A
terceira classe era constituída pela burguesia e pelos plebeus, com uma
infinidade de diferenciações tanto entre essas duas camadas quanto dentro de
cada nível da hierarquia do povo.
A
questão que queremos examinar nesta série é a seguinte:
Até que ponto todas essas pessoas
como o clero, a nobreza, os proprietários de terras, os estudiosos, os
trabalhadores industriais, os mercadores, os camponeses e os trabalhadores
manuais deveriam participar efetivamente da direção do Estado?
Participação no poder público com base em números
As
organizações políticas modernas geralmente resolveram o problema da
participação no poder público com base em números. O estado assume uma
posição indiferente em relação às classes sociais, afirmando que todos são
iguais e têm igual direito a um voto. Na hora de votar, o resultado é obtido
numericamente, sendo que a escolha é feita por maioria de votos.
Todos com direito a voto igual em uma assembleia municipal no Maine |
Aparentemente, é uma solução muito boa, já que a direção do Estado deve
estar nas mãos dos mais interessados, e a maioria deve estar mais
interessada do que qualquer pequeno grupo na direção dos assuntos públicos.
Porém, ao consideramos a questão da competência e da especialização, surgem
falhas. Com efeito, muitas vezes a maioria dos homens não é mais
inteligente, com mais critérios para julgar e condições para orientar. Essas
pessoas normalmente constituem uma minoria na sociedade. Assim, o erro neste
sistema é que estabelece que tudo se resolva simplesmente pelo peso dos
números, o que exclui as elites e as destina a serem sempre derrotadas pela
maioria.
Esse
mecanismo simples de voto majoritário acaba virando de cabeça para baixo, ou
seja, excluem-se os líderes autênticos que realmente têm condições de
orientar a maioria. Em vez disso, aqueles que são capazes de manipular esse
sistema nos bastidores se erguem como uma elite artificial que controla o
voto da maioria.
Por
isso, o Papa Pio XII chamou a atenção dos estadistas e dos homens de cultura
para o seguinte problema: Saber como
se deve distribuir a participação na direção de um Estado no interior de um
país para que seja sabiamente orientado e governado.
Para
cumprir esta tarefa, estudaremos como isso aconteceu na Idade Média, a fim
de verificar se uma sugestão de solução pode ser encontrada para nossos
tempos.
Continua
Postado em 17 de maio de 2021
| Prof. Plinio |
Sociedade Orgânica foi um tema caro ao falecido Prof. Plinio Corrêa de Oliveira. Ele abordou este tema em inúmeras ocasiões durante a sua vida - às vezes em palestras para a formação de seus discípulos, às vezes em reuniões com amigos que se reuniram para estudar os aspectos sociais e história da cristandade, às vezes apenas de passagem.
Atila S. Guimarães selecionou trechos dessas palestras e conversas a partir das transcrições das fitas e de suas anotações pessoais. Ele traduziu e adaptou-os em artigos para o site da TIA. Nestes textos, a fidelidade às ideias e palavras originais é mantida o máximo possível.
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