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O Reino Político-Social de Cristo

Plinio Corrêa de Oliviera
O próprio conceito de Cristandade apresenta diferentes graus de entendimento.

Um dos significados é em relação aos inimigos muçulmanos ou bárbaros que avançaram contra os países católicos, com o objetivo de aniquilá-los.

Nesse sentido, a Cristandade era entendida como o conjunto de povos se defendendo, que ofereciam ajuda mútua tanto na defesa quanto no ataque. Mas essencialmente em ataques defensivos.

Apoiando uns aos outros e interagindo dessa forma, eles formavam uma sociedade. Era um tipo de assistência militar mútua com ideais sublimes. Essa ajuda mútua durava enquanto o perigo permanecia. E, como os inimigos eram implacáveis, a assistência mútua continuou por séculos.

old map of Europe

Acima, mapa da cristandade medieval,
abaixo, brasão do Sacro Império Romano-Germânico

Crest of the Holy Roman Empire
Outro significado de, Cristandade a apresentava como o conjunto de nações governadas pela lei de Cristo, acreditavam em Jesus Cristo, eram submissas à Igreja Católica e organizavam suas vidas internas de acordo com as máximas do Evangelho.

Eram inspiradas pelos mesmos princípios, o que as levava a ter o mesmo espírito e mentalidade, pelo que, por sua vez, constituíam uma família de nações. Isso não se passava apenas na ordem política, mas também na ordem cultural.

Daí surgiu a tendência de esses vários povos adotarem um único estilo artístico, o que influenciava a maneira como construíam seus monumentos, palácios, igrejas, etc.

Para outros ainda — era chocante que o espírito católico pudesse ficar reduzido a algo tão pequeno — que – a Cristandade fosse apenas o Sacro Império Romano Germânico e não o conjunto de todas as nações católicas da Terra.

Esses conceitos eram inter-relacionados e um tanto fluidos. O fato de que, à medida que se desenvolvia, nunca fosse definido tal qual estamos fazendo aqui, mostra que o conceito estava sendo formado gradualmente nas profundezas das almas.

Não era o objeto desse tipo de amor que deu origem ao conceito. A mentalidade medieval gerou a ideia de Cristandade como uma sopa quente que essas nações preparavam juntas; então, quando a Revolução entrou em cena, a sopa esfriou.

De fato, o Renascimento terminou com o amor pela Cristandade alegando que o cristianismo não nos deu a inspiração suprema da cultura e da arte. Afirmou que essa inspiração deveria ser buscada no paganismo greco-romano.

Por outro lado, a ideia de que a Cristandade pudesse ser reduzida apenas ao Sacro Império Romano-Germânico também produziu um fruto ruim.

Depois que o protestantismo dilacerou a Cristandade, o que restou passou a ter um equilíbrio precário e desistiu da verdade de que a sociedade sempre foi influenciada pela religião católica.

As pessoas continuaram a falar da Cristandade, mas o conceito foi reduzido para se referir a um certo acordo das nações cristãs sobre cultura, comércio e economia. A consequência foi que a vida cultural e a atividade econômica pareciam capazes de atingir os objetivos da sociedade sem recorrer à religião, que foi relegada a um segundo plano.

Louis XV and Frederick II

Luís XV e Frederico II,
católico vs. protestante

Ainda havia alguns resquícios do bom sentimento oposto que viviam de forma confusa ao lado desse sentimento maligno. Por exemplo, quando o rei prussiano Frederico II – que realmente era um tipo miniatura do Anticristo – foi derrotado pela imperatriz Maria Teresa da Áustria, ele precisou de um novo período de paz para restaurar seu país. Para esse propósito, ele buscou o apoio da Inglaterra.

Agora, quando a Inglaterra vê uma causa maligna, ela sempre a apoia. Foi o que aconteceu neste caso: a Inglaterra entrou e fez uma aliança com a Prússia. O Rei francês Luís XV, vendo a Áustria abandonada e em perigo, julgou ser seu dever apoiar a Áustria. Daí nasceu a Aliança Franco-Austríaca que se voltou contra a liga protestante anglo-prussiana, o que causou grande alegria aos católicos. Mas essas alianças foram feitas não para lutar pelo restabelecimento da Cristandade, mas pela sobrevivência dos respectivos países.

O correto teria sido que a França e a Áustria tivessem aniquilado a Prússia e só depois abrissem fogo contra a Inglaterra.

A coexistência do bloco católico e do bloco protestante gerou uma atmosfera letárgica ecumênica. Ambos os lados dormiriam confortavelmente lado a lado. Era mais um passo em direção à diluição da ideia de que a Religião deveria influenciar a ordem civil.

O que faltava eram almas fervorosas com tochas nas mãos se levantando contra aquela letargia. Acredito que sua ausência foi um castigo para a Cristandade. Dessa situação advém o amolecimento dos católicos de hoje que tanto influencia a sociedade temporal e espiritual.

‘O Reino de Cristo nos corações’

Em certo momento, os católicos começaram a ser induzidos a crer que o Reino de Cristo – a Cristandade – deveria existir apenas nos corações, isto é, na ordem espiritual. Isso também implicava o Reino social de Cristo, que aperfeiçoaria até mesmo a ordem social.

Mas o social era entendido como se o Estado pudesse ser secular, mesmo que a sociedade não o fosse. Falavam de um “Estado virtualmente cristão.” Isso já era uma traição. Era indispensável que o Reino político-social de Nosso Senhor Jesus Cristo fosse proclamado sem medo.

Infelizmente, aqueles católicos não tinham nem a ideia de uma Revolução cultural que abrangesse toda a sociedade, nem a de uma Contra-Revolução cultural, igual e oposta a ela. Eles não tinham essa ideia ou pelo menos não falavam dela. Tudo se relacionava simplesmente com a ordem social.

O Reino de Nosso Senhor Jesus Cristo ou inclui toda a esfera temporal com sua ordem político-social ou é uma paródia. No entanto, naquela época, ninguém ousou defender essa posição.

Quando uma heresia ou um mau costume contra a Moral católica surgisse, seria reprimido e o mal em particular extirpado. Poderia mesmo ser extirpado como um câncer do corpo, contudo, não era ensinado aos bons católicos a existência do processo revolucionário. Se isso tivesse sido feito, eles teriam evitado que o erro ressurgisse.

Cumplicidade do semi-bom

O que fazemos quando não atacamos nosso próximo que ataca Nosso Senhor Jesus Cristo? Se não atacamos o mal, não somos realmente bons, mesmo que sejamos católicos em outros pontos. Somos apenas semi-bons.

Se destruíssemos o muro do semi-bom que cerca o mal, ele seria aniquilado.

Edict of Nantes

Rei Henrique IV assina o Edito de Nantes dando direitos aos protestantes na França católica

O ponto fraco da psicologia dos bons é que em um certo ponto de suas vidas eles param de fazer o esforço de combater o mal.

Um senhor medieval podia acreditar que houvesse tantas coisas boas ao seu redor – belas igrejas, procissões, a vida harmônica na cidade, guildas sadias etc. – que ele podia descansar. Tudo ao seu redor parecia tão forte e estável que ele podia desconsiderar algumas fagulhas de heresia e Revolução aqui e ali. Ele tinha uma tendência a parar de fazer o esforço de combater o mal e descansar.

Isso resultou na preguiça crônica dos bons em combater o mal, e sua falta de vigilância para ver sua importância.

É difícil atacar os semi-bons porque a maioria das pessoas acredita que eles são pessoas excelentes.

No futuro seria necessário fazer uma teoria do mal e da heresia de tal forma que o homem comum fosse capaz de entender que o mal vive da concessão do semi-bom. É o que deve ocorrer no Reino de Maria.

 

Postado em 16 de dezembro de 2024

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