Seleção Biográfica:
Afonso nasceu em Nápoles, no sul da Itália, em 1696. De família nobre, seu pai era Capitão de uma galera real napolitana. Afonso foi aluno brilhante e fez grande progresso em todos os tipos de aprendizado. Pedia pintar belamente e foi mestre de cravo aos 13 anos. Seu primeiro trabalho foi um livro de poesia.
Santo Afonso Maria de Ligório
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Aos 16 anos, recebeu seu doutorado em direito pela Universidade de Bolonha. Na cerimônia, ele era tão pequeno que foi coberto pela vestimenta de seu doutorado, e todos os espectadores riram.
Então embarcou na prática da lei e, aos 19 anos, praticou seu primeiro caso nos tribunais. Era extraordinariamente capaz e bem-sucedido e, aos 26 anos, era um dos líderes da advocacia napolitana.
Dada sua fama, Afonso foi escolhido pelo Grão-Duque de Gravina em 1723 para representá-lo em um processo contra o Grão-Duque da Toscana, em um caso em que uma propriedade avaliada em 2 milhões de marcos estava em jogo. No dia da corte, Afonso fez um discurso de abertura brilhante e sentou-se confiante na vitória.
Mas o advogado adversário respondeu imediatamente em tom arrepiante: “Seus argumentos são uma perda de fôlego. Você ignorou um documento que destrói todo o seu caso.”
Foi-lhe apresentado um documento que ele havia revisado muitas vezes e interpretado de acordo com as leis de Nápoles. No entanto, o advogado adversário argumentou corretamente que o caso tinha de ser julgado de acordo com as leis da Lombardia, onde ficava a Toscana. Isso reverteu o processo e esmagou o jovem advogado. Ele deixou o tribunal dizendo: “Mundo, eu te conheço agora. Tribunais, vocês não me verão mais.”
Uma palestra de direito na Universidade de Bolonha. Santo Afonso recebeu um doutorado aos 16 anos
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Seu orgulho profundamente ferido pelo forte golpe em sua carreira, ele se trancou por três dias e recusou comida. Então começou a ver que essa humilhação foi enviada por Deus para arrancá-lo de sua carreira e realizações, que o tinha levado a negligenciar a oração e as práticas de piedade que faziam parte integrante de sua vida.
Nessa situação, Afonso sentiu um apelo divino. Abandonou sua carreira jurídica e se dedicou a exercícios piedosos e obras de caridade. Em 28 de agosto de 1723, ao deixar um hospital, ele se viu cercado por uma luz misteriosa. Sentiu a terra tremer sob seus pés, e uma voz interior disse: “Por que você espera para deixar o mundo e se entregar a Mim?” Isso ocorreu duas vezes.
Afonso deixou o hospital e foi à Igreja da Redenção dos Cativos. Pôs a espada aos pés de uma estátua de Nossa Senhora da Misericórdia e tomou uma resolução solene de entrar no estado eclesiástico. Prevaleceu sobre a forte oposição de seu pai, renunciou ao seu direito de primogenitura e começou a estudar teologia em sua casa.
Foi ordenado em 21 de dezembro de 1726 aos 30 anos e, durante seis anos, desenvolveu um intenso apostolado realizando missões e pregando ao povo, especialmente às classes pobres nas áreas rurais. Mais tarde, seguindo o conselho de um Bispo, fundou a Congregação do Santíssimo Redentor, ou a Ordem Redentorista.
Nos 25 anos seguintes, viajou por todas as províncias do Reino de Nápoles em missões contínuas, alcançando grande sucesso.
Nossa Senhora das Misericórdias
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Na segunda parte de sua vida, quando o cansaço e as enfermidades o impediram de continuar o trabalho missionário, ele concentrou seus esforços na escrita, mediante a qual continuaria sua atividade pastoral.
Baseou seus escritos em sua experiência real em confessar milhares de almas e pretendia que elas oferecessem à Congregação orientação prática para o Sacramento da Penitência. Este foi o começo de seu trabalho em Teologia Moral.
Em 1747, o Rei Carlos de Nápoles desejou fazer de Afonso o Arcebispo de Palermo, mas ele recusou. Em 1762, ele foi forçado pela obediência formal ao Papa a aceitar o Bispado de Santa Ágata dos Godos, uma pequena diocese Napolitana perto de Nápoles.
Ele reformou a diocese frouxa, mais de uma vez enfrentando tentativas de assassinato. Finalmente, sua saúde debilitada tornou impossível para ele continuar.
Um terrível ataque de gota o deixou paralisado até o fim de seus dias, causando-lhe ademais uma ferida no peito resultante da inclinação de sua cabeça, que por sua vez pressionava o queixo junto ao tórax. Ele só podia celebrar a Missa apoiado numa cadeira. Apesar dessas enfermidades, a Santa Sé não permitiu que ele deixasse seu rebanho até 1775, aos 79 anos.
Ele se retirou para o Mosteiro de sua Ordem para se preparar para a morte, mas teria que esperar mais 11 anos. Cego e surdo, mas ainda lúcido, ele viveu seus últimos anos em cadeira de rodas. Estava gravemente, tendo recebido por nove vezes a Extrema Unção. Foi atormentado tanto física, quanto moralmente, pois foi agredido por alguns anos de preocupações e angústias sobre o futuro de sua Ordem, bem como por fortes tentações contra a pureza.
Morreu pacificamente na Casa Mãe dos Redentoristas, perto de Nápoles, em agosto de 1787, o 90º ano de sua vida.
Comentários do Prof. Plinio:
Esta seleção longa e interessante oferece muitos pontos para comentários.
Primeiro, é curioso notar como os progressistas detestam Santo Afonso de Ligório, porque ele é muito preciso nas suas demandas em Moral. Como o progressismo quer um espírito permissivo em erros morais, eles fazem o que podem para boicotar Santo Afonso. Essa é uma razão para darmos a ele uma veneração especial.
Uma frota de galés Venezianas
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Segundo, também é interessante notar o aparente contraste entre as carreiras dele e de seu pai. Seu pai era Capitão de uma Galera Real, um homem acostumado a comandar soldados e prisioneiros condenados a remar, ligados por correntes ao fundo do navio.
Aqueles homens - criminosos cujas sentenças eram comutadas para remo nas galés - procuravam frequentemente uma oportunidade de entregar a tripulação do navio a um inimigo e escapar. Portanto, essa posição de comando exigia um punho de ferro. Este foi o pai de Santo Afonso.
Aparentemente, o filho era muito diferente. Tocar cravo, pintar quadros e escrever poesia poderia fazê-lo parecer mais frágil e delicado, mas, na verdade, o que ele teve que suportar mais tarde na vida seria muito mais do que o que seu pai havia carregado.
Terceiro, o caso legal que causou essa profunda decepção no jovem Afonso e resultou em sua conversão foi uma disputa envolvida em dois códigos de leis feudais diferentes. As leis feudais eram muito diferentes de um lugar para outro. Tais problemas ainda podem ser encontrados hoje em disputas que envolvem diferentes nações, nas quais o processo é regido pelas leis do país onde a propriedade disputada se encontra.
Muito provavelmente, o caso de Afonso envolveu uma terra disputada por Nápoles e Toscana, com ambas as partes reivindicando direito a ela. Assim, o advogado da oposição, percebendo que perderia o caso com base nas leis de Nápoles, alegou que todo o processo deveria ser reexaminado com base nas leis da Toscana.
Esse argumento virou a defesa de Afonso de cabeça para baixo. Com essa manobra, Santo Afonso viu a fragilidade da justiça humana. Ele ainda era jovem, e até então tinha ilusões sobre justiça nos tribunais.
Quarto, ele era um jovem nobre e brilhante. Seus sucessos o tornaram apegado às coisas terrenas e diminuíram sua piedade. Muitas vezes, uma carreira de sucesso faz com que uma pessoa perca seu amor pelas coisas de Deus. Vendo essa tepidez, Deus escolhe abalar a carreira de um homem para convertê-lo. Foi o que aconteceu com Afonso.
Ele percebeu que muitos de seus amigos o lisonjeavam por causa de seu alto status e talento em direito. Assim, ele decidiu renunciar a todas as coisas terrenas. Quantas vezes também precisamos de correções semelhantes de Deus para entrar na vida contra-revolucionária ou permanecer nela! Felizes os que não precisam desses castigos!
Uma vila perto de Nápoles. A ordem de Santo Afonso foi voltada para a pregação às pessoas comuns
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Quinto, é belo ver que a primeira coisa que ele fez após sua resolução de oferecer sua vida a Deus foi entrar em uma igreja e colocar sua espada aos pés de Nossa Senhora. Quando um nobre abandonava sua espada, era simbólico de sua renúncia ao mundo, porque um nobre nunca se apresentaria no mundo sem sua espada.
Sexto, ele também renunciou ao seu direito de primogenitura. Era um costume sábio para as famílias de todos os lugares antes da Revolução Francesa dar a maior parte de sua fortuna ao filho primogênito.
Ele herdaria a fortuna e o título de nobreza. Era uma maneira de impedir que o enorme esforço de muitas gerações se dispersasse, dividindo as propriedades entre todos os irmãos e irmãs. Permitiu que a família continuasse sua própria história.
O primogênito recebia essa missão, mas também a responsabilidade de ajudar seus irmãos e irmãs, bem como seus filhos, a progredir. Foi outro fator que manteve a família unida em torno do primogênito e deu estabilidade à família. Escusado será dizer que, tão logo possível, a Revolução se esforçou para abolir o direito de primogenitura.
Sétimo, não foi por acaso que Santo Afonso escolheu passar mais de 25 anos de sua vida pregando às pessoas humildes. Durante seu tempo, o clero estava experimentando um enorme relaxamento no zelo e nos costumes. A Igreja tinha muitos bens e riqueza, e era possível que os padres vivessem fazendo muito pouco.
Portanto, um grande número deles foi para as cidades para se misturar na sociedade. As pessoas daquelas áreas montanhosas rurais foram quase abandonadas pelo clero. Vários tipos de prefiguras da máfia infestavam tais áreas, as pessoas eram muito primitivas e ignorantes, a vida era difícil e desagradável.
O clero fugiu deles. As pessoas do povinho ainda tinham bons costumes e boa vontade, mas ignoravam quase tudo em relação à religião e corriam o sério risco de perder suas almas.
Santo Afonso, chamado por Deus a abandonar todas as coisas brilhantes do mundo, adotou um tipo oposto de trabalho. Foi pregar e cuidar dos mais humildes e pobres, dos menores camponeses, das pessoas mais ignorantes do Reino das Duas Sicílias. Nos ensina que Deus normalmente chama uma pessoa para fazer o oposto do que ela estava apegada.
Sua experiência com as pessoas o preparou para escrever suas grandes obras sobre Moral
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Oitavo, a Ordem dos Redentoristas que ele fundou nasceu da preocupação de que todas aquelas pessoas simples fossem abandonadas novamente depois que ele morresse. Mesmo se ele convertesse uma, duas ou várias aldeias, muitas outras ainda esperavam ser convertidas.
Seria melhor fundar uma Ordem de sacerdotes que continuasse seu trabalho. Sua Ordem é voltada para pregar continuamente a palavra de Nosso Senhor às pessoas comuns.
A vida do padre Redentorista é muito bonita. Ele viaja pregando, permanecendo não mais de dois meses em uma cidade. De tempos em tempos, ele se retira para um mosteiro da Congregação e fica lá por um tempo - talvez 10 a 15 dias - em completo silêncio, fazendo penitências severas e recebendo flagelações.
Isso é para equilibrar sua pregação bem-sucedida. Após esse retiro, ele é enviado para outras cidades e continua seu trabalho. Ele é um sacerdote perpetuamente itinerante, sem a possibilidade de se apegar às coisas do mundo, pregando continuamente a palavra de Deus.
Nono, Santo Afonso foi chamado para ser um intelectual, um grande moralista e um Doutor da Igreja. Durante os primeiros 25 anos de seu trabalho, ele não sabia disso. Sua única preocupação era fazer o bem ao povo. Esse contato, no entanto, proporcionaria uma grande familiaridade com os problemas morais cotidianos concretos das pessoas. Essa experiência inestimável daria a ele os elementos para lidar objetivamente com a Moral Católica.
Seu estudo anterior sobre direito também o preparou para ser um grande moralista, porque, como todos sabem, o Direito exige moral em sua explicação mais profunda. Devemos observar que o primeiro objetivo de Santo Afonso não foi escrever um tratado, mas dar uma orientação prática aos sacerdotes de sua Congregação na resolução dos problemas das pessoas comuns.
Então, sua vida teve várias fases diferentes que prepararam o moralista por vir. É uma coisa maravilhosa ver na vida de muitos santos como a Divina Providência esculpiu magicamente suas almas para propiciar o cumprimento de suas missões. Muitas vezes o santo não percebe isso, e somente no Céu ele entenderá por que as coisas aconteceram como aconteceram. É o caso de Santo Afonso.
Santo Afonso estava com a cabeça tão inclinada que seu queixo produziu uma ferida no peito
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Décimo, há o tremendo sofrimento de Santo Afonso no final de sua vida. Os efeitos da gota obrigaram-no a se dobrar, com o queixo apoiado tão fortemente no peito que lhe causou uma ferida dolorosa. Então, 11 anos em cadeira de rodas com todo o inconveniente que isso representa.
Ele era um grande Santo, um Bispo, um Doutor da Igreja, um grande moralista, fundador de uma Ordem Religiosa. Com uma vida tão repleta, ele ainda foi atormentado por todos os tipos de tentações espirituais no final de sua vida. Ele não sucumbiu a elas, mas Deus pediu que ele lutasse contra elas até o fim. Somente no momento de sua morte a paz retornou à sua alma.
Dou um pequeno fato final da vida dele para a edificação dos senhores. Nos últimos anos de sua vida, quando ele estava em uma cadeira de rodas, todos os dias um irmão costumava levá-lo aos jardins do claustro para tomar um pouco de ar. Um dia, ele perguntou ao irmão: “Já terminamos os três terços do Rosário?”
O irmão respondeu: “Não me lembro se terminamos todos eles, mas tenho certeza de que chegamos a esse e aquele mistério.”
Santo Afonso começou a rezar os mistérios que não tinha certeza de ter dito.
O irmão protestou: “Mas, meu pai, o Sr. está dispensado de dizê-lo por causa de sua idade e estado de saúde.”
Ele respondeu: “Se eu não rezasse meu Rosário inteiro ainda que num dia, teria receio de minha salvação.”
É uma nota de ouro para terminar um comentário sobre uma vida de ouro. Peçamos a Santo Afonso Maria de Ligório que proteja a nós e a todas as pessoas hoje ignorantes e abandonadas por causa de tantos maus padres progressistas, Bispos e Prelados superiores.
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Prof. Plinio Corrêa de Oliveira | | A secção Santo do Dia apresenta trechos escolhidos das vidas dos santos baseada em comentários feitos pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira. Seguindo o exemplo de São João Bosco que costumava fazer comentários semelhantes para os meninos de seu Oratório, cada noite Prof. Plinio costumava fazer um breve comentário sobre a vida dos santos em uma reunião para os jovens para encorajá-los na prática da virtude e amor à Igreja Católica. TIA do Brasil pensa que seus leitores poderiam se beneficiar desses valiosos comentários.
Os textos das fichas bibliográficas e dos comentários vêm de notas pessoais tomadas por Atila S. Guimarães de 1964 até 1995. Uma vez que a fonte é um caderno de notas, é possível que por vezes os dados bibliográficos transcritos aqui não sigam rigorosamente o texto original lido pelo Prof. Plinio. Os comentários foram também resumidos e adaptados aos leitores do website de TIA do Brasil.
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