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O Papel dos Leigos na Igreja – I

Os Leigos devem defender a Igreja?
Eles poderiam criticar Padres e Bispos?

Marian Horvat, Ph.D.
A TIA recebeu várias objeções em relação ao artigo "Três perguntas ao Pe. Pagliarani." Nele, Atila Guimarães respeitosamente faz perguntas ao Superior da FSSPX sobre as posições oficiais emitidas sobre o Motu Proprio Traditionis custodes.

A maioria das objeções se resumem a um simples "Como você ousa, um leigo, questionar um padre?" Mesmo antes deste artigo ser publicado, eu estava ciente de que outros padres de orientação tradicional ou conservadora falaram acaloradamente sobre como o papel do leigo é obedecer e rezar, e nunca questionar um padre ou criticá-lo.

Resumindo, existem duas objeções conectadas dirigidas aos leigos:
  1. Não tente salvar a Igreja. Não é missão dos leigos tentar salvar a Igreja porque a Igreja não precisa de ninguém para isso: O Espírito Santo e Nosso Senhor por meio da Hierarquia e do clero cuidarão da defesa da Igreja. Em vez disso, você deve se concentrar em salvar sua alma e se tornar um santo.

    False prophets

    Padres maliciosos acusam leigos que defendem a Igreja de serem falsos profetas

    Pessoas que dizem estar lutando para defender a Igreja são arrogantes e podem ser caracterizadas como falsos profetas. Falar muito sobre erro, mal e crise na Igreja é sinal de um falso profeta. O verdadeiro santo fala principalmente da grandeza de Deus e da beleza da virtude, em vez de se concentrar nas notícias e escândalos na Igreja.

  2. Você nunca deve criticar ou questionar um padre, Bispo ou Papa porque o papel do leigo é obedecer à Hierarquia e ao clero. Nenhum leigo deve criticar um superior, mas deve suportar tudo o que ele diz com mansidão e humildade. Se você critica publicamente, está indo contra o seu papel e mostrando orgulho.
Essas acusações são infundadas.

Para demonstrá-las, dividirei minha resposta em quatro partes:

I - Precedentes Históricos;
II - Direito Natural;
III - Doutrina Teológica;
IV - Direito Canônico


I. Precedentes históricos

Ao longo da História, os Santos leigos se levantaram para defender e proteger a Santa Madre Igreja contra as heresias e os erros. São inúmeros os exemplos de leigos - alguns deles Santos - que cumpriram seu dever religioso de defender a Igreja e desafiar publicamente aqueles que se desviaram do caminho ortodoxo, mesmo quando os infratores foram padres, Bispos ou Papas.

1. São José

Pius IX

8 de dezembro de 1870: Pio IX nomeou São José Protetor da Igreja

Um fato preliminar a ser considerado nesta discussão é que, por ser ele o chefe da Sagrada Família, a Igreja Católica escolheu São José para ser o Protetor da Igreja.

Assim, toda a Igreja está confiada aos cuidados deste Grande Patriarca, que não era membro da Hierarquia, mas sim um simples leigo.

O próprio fundamento dessas duas objeções é destruído pelo fato de que a Igreja escolheu oficialmente São José para ser seu Defensor.

2. Nossa Senhora de La Salette

O melhor exemplo de leiga - uma mulher - que criticou a Hierarquia e o clero é Nossa Senhora. Ela apareceu em La Salette para avisar ao mundo que o clero se tornaria uma "cloaca de impureza" e Roma se tornaria a "sede do Anticristo."

Embora Nossa Senhora tenha sido um modelo para as religiosas durante o período em que vivia no Templo, mais tarde ela o deixou para se casar com São José e entrar no estado laico como esposa e mãe.

Se criticar os Papas e o clero fosse impróprio para um leigo e o ato de um falso profeta, então essas condenações se aplicariam a Nossa Senhora, o que é um absurdo.

Este mesmo argumento é válido para muitas outras aparições nas quais Nossa Senhora advertiu os fiéis sobre a apostasia vindoura da Hierarquia e do clero.

3. Santa Catarina de Siena

Outra leiga, Santa Catarina de Siena, foi uma severa crítica do Papa Gregório XI que permaneceu em Avignon. Mais tarde, ela não hesitou em reprovar também o Papa Urbano VI.

Alguém pode objetar que ela fez críticas privadas, não públicas, ao Papa por meio de cartas. Embora seja pertinente que originalmente suas admoestações fossem privadas, ao canonizar Santa Catarina e tornar pública sua correspondência, inclusive as críticas ao Papa, a Igreja mostrou sua aprovação por essas louváveis ações de Santa Catarina e a apresentou como um exemplo a ser seguido por todos os Católicos.

4. São Tomás Morus

St Thomas More

São Tomás Morus

Um exemplo brilhante de Santo leigo que enfrentou quase toda a hierarquia inglesa da época para defender a Fé foi São Tomás Morus, que morreu mártir por se opor ao Rei e à Hierarquia e defender a doutrina Católica.

Mesmo antes de enfrentar o martírio, Tomás Morus assumiu como missão a erradicação dos hereges durante seu mandato como Chanceler de 1529 a 1532. Na verdade, um de seus principais objetivos ao aceitar o cargo de Chanceler foi proteger a Igreja contra hereges inimigos e puni-los. Ele estava errado como um leigo ao entrar naquele campo de batalha contra os Bispos que logo depois seriam condenados como hereges? Absolutamente não.

5. São Clemente Hofbauer

Quando ele ainda era um jovem na escola, ele confrontou padres e professores seminaristas. Ele declarou publicamente suas concessões ao Racionalismo e sua negação do dogma da Imaculada Conceição. Ele ainda era um jovem, mas não hesitou em falar quando ouviu o erro sendo ensinado publicamente por clérigos eruditos.

6. Santos Videntes

Bem Aventurada Ana Maria Taigi (aqui e aqui), e a Bem Aventurada Elizabeth Canori Mora e outros santos videntes leigos deixaram profecias que falam sobre uma grande apostasia na Hierarquia e no clero. A Igreja permitiu que seus escritos se tornassem públicos. Independentemente de se acreditar ou não nessas previsões, elas podem ser corretamente consideradas críticas fortes à Hierarquia e ao clero.

7. Ilustres leigos ainda não canonizados

Entre muitos leigos Católicos famosos que criticavam os eclesiásticos, apresento apenas dois:

Louis Veuillot

Louis Veuillot

Louis Veuillot

Notável entre os leigos Católicos Ultramontanos era o polemista Francês Louis Veuillot (1813-1883), editor do jornal Católico contrarrevolucionário L’Univers. Ele não temia protestar fortemente contra as concessões da elite clerical da Igreja Francesa, a quem descreveu como "covardemente

Sua luta foi particularmente voltada contra Mons. Felix Dupanloup, Bispo de Orleans, um dos líderes do Liberalismo Católico na França e um dos chefes da corrente liberal no Concílio Vaticano I.

Uma prova de que Veuillot estava correto em defender a Igreja é o magnífico elogio de sua obra proferido por São Pio X em 1913 no centenário do nascimento deste ardente e talentoso apologista Francês, uma das maiores homenagens que um Católico pode receber de um Papa.

Orestes Brownson

Outro ilustre leigo que entrou na luta pública contra os eclesiásticos que estavam promovendo os princípios do Liberalismo é o intelectual da Nova Inglaterra Orestes Brownson. Ele escreveu e publicou uma crítica contundente contra o Card. John Henry Newman em um ensaio sobre o Desenvolvimento da Doutrina Cristã. Newman, hoje chamado de "o teólogo do Vaticano II," defendeu as tendências reformadoras em muitos assuntos de teologia que foram posteriormente adotados pelo Concílio.

Brownson foi elogiado por sua luta contra o Liberalismo pelo Papa Pio IX.

Primeira conclusão

A simples apresentação desses casos de leigos que defenderam a Igreja no passado põe de lado as duas objeções mencionadas.

Vemos que é apropriado e bom que os leigos defendam a Igreja. Também vemos que não é errado - por exemplo, impróprio, orgulhoso, arrogante - que um leigo critique os eclesiásticos, nem essa ação per se é característica de falsos profetas.

Continua

Postado em 8 de outubro de 2021